BRASIL – Em tempos em que a velocidade digital ameaça a contemplação e a profundidade das palavras, surge da vastidão do interior brasileiro uma voz que resgata a essência da literatura: Nonato Vieira, poeta e escritor que nasceu em Ribeiro Gonçalves, no Piauí, e hoje vive em Araguaína, Tocantins, carregando a sensibilidade de quem conhece tanto o silêncio dos campos quanto a urgência dos sentimentos humanos. Sua presença literária afirma uma ética da atenção, da pausa e da escuta, como se cada texto pedisse ao leitor um compasso a mais de respiração.
“A geografia comum por onde andei me atravessa e traz afetos. Algo no sertão, no rio, nas manhãs silenciosas e nos fins de tarde parece carregar um apelo. Tudo isso me ensinou a escutar antes de escrever.”
Nonato representa uma resistência silenciosa, embora eloquente, contra a massificação cultural que reduz a literatura a consumo apressado. Em sua obra, cada palavra nasce como quem amadurece fruta no tempo certo, escolhida com o cuidado que a lapida até que se revele um brilho de humanidade. Seu gesto de escrita começa no silêncio e volta a ele, como quem sabe que as palavras não se apressam para existir.
Poesia como refúgio
A literatura brasileira contemporânea se move em pluralidade de vozes, mas, no caminho delicado de Nonato, a intimidade ganha corpo e sentido. Sua escrita se compromete com a escuta demorada, com a lentidão que permite nomear dores, guardar afetos e enxergar a luz que persiste mesmo nos dias escuros. Nessa ética do detalhe, a poesia funciona como abrigo e espelho.
Ao assumir a pausa como gesto poético e político, Nonato reposiciona o papel do escritor no presente. Em vez de disputar a velocidade do algoritmo, oferece ritmo: convites à presença, à respiração, ao reconhecimento de si. Não escreve para vencer o tempo, mas para habitá-lo com dignidade.
“Penso que o papel do escritor hoje é oferecer não só histórias, mas ritmo, um ritmo mais lento, saudável e funcional, como convites ao leitor. Reencontrar a si mesmo.”
Entre o silêncio e a palavra
Em Nonato, o silêncio não equivale à falta de voz; é matéria-prima e lugar de revelação. As imagens que surgem de seus textos não enfeitam a linguagem: elas a desvelam. Nesse jogo fino de contenção e entrega, a palavra sabe que o que não se diz também fala e, às vezes, fala mais fundo.
O processo criativo, para ele, acontece nesse território de cuidado, onde a palavra só entra quando chega amadurecida. Assim, cada verso e cada frase guardam a temperatura exata do que nasce de dentro para fora: uma linguagem que acolhe, provoca e cura.
Guardião da sensibilidade
Nonato escolhe a delicadeza como forma de coragem. Em sua literatura, vulnerabilidade não é fraqueza: é método, ética e caminho. Ele escreve para permanecer inteiro diante da vida, para reconhecer cicatrizes e, ao mesmo tempo, impedir que a dor defina o destino da experiência.
“A minha escrita nasce do existencialismo, inspirado em Clarice e Fernando Pessoa, de vulnerabilidades, das dores que precisei atravessar, das perdas que precisei nomear, e até das memórias que insistem em permanecer mesmo quando eu gostaria de esquecê-las.”
Nessa travessia, a literatura aparece como presença que salva em silêncio, não pela grandiloquência do grito, mas pela companhia discreta que sustenta quando tudo parece desabar. A palavra funciona como gesto de cuidado: espelho que reflete e devolve o humano ao próprio humano.
A música das palavras e a palavra da música
Em Nonato, poesia, prosa e música se alimentam. Não existe fronteira rígida entre os gêneros, apenas corpos diferentes de uma mesma alma artística. A musicalidade atravessa a frase, o ritmo sustenta a imagem, e a imagem encontra na melodia um lugar para pulsar mais fundo.
“Poesia, prosa e música são diferentes corpos de uma mesma alma. Escrevo como quem compõe uma melodia, canto como quem narra uma história e conto histórias como quem declama versos.”
Esse entrelaçamento cria uma obra que se movimenta entre a página e o som, entre o que se lê e o que ressoa. Ao unir as linguagens, o autor amplia a potência de alcance sem diluir a densidade. O contrário: adensa pela simplicidade, aproxima pela beleza, toca pelo essencial.
O que resta depois do silêncio
Seu livro ‘O que resta depois do silêncio’ nasce de uma pergunta tão simples quanto radical: o que permanece quando tudo para? Nessa pausa, Nonato encontra a chance de dizer o necessário, sem pressa nem ruído, apenas o que importa, e importa muito.
“O silêncio é também cura, o que me permite ressignificar dores, transformar desafetos em poesia e seguir acreditando que, mesmo quando tudo parece calado, ainda há vida pulsando dentro.”
Mais que publicar, o autor busca ligação real, encontro que faça sentido para quem lê e para quem escreve. É literatura como gesto de partilha: não para erguer monumentos, mas para deixar rastros de presença, afeto e verdade.
Um convite à contemplação
Em uma época de estímulos incessantes, a obra de Nonato oferece um contracanto: convite à calma, ao recolhimento, ao encontro consigo. Não se trata de romantizar o silêncio, mas de fazê-lo trabalhar a favor da lucidez — espaço de escuta onde a palavra volta a ser necessária. Sua literatura confirma que a delicadeza não é ausência de força; é a força que sabe durar.
“No fim, escrevo porque não sei existir de outro modo e porque quero deixar como testemunha não um monumento, mas um rastro de afeto, sensibilidade e verdade.”
Nonato Vieira não é apenas um escritor: é um artesão do tempo interno, um tradutor do que ainda pulsa quando o mundo se cala. Em sua página, a vida não vira ruído, vira sentido. E o leitor, ao terminar a leitura, se percebe menos só.