MANAUS (AM) – A manhã do dia 21 de abril foi marcada por profunda tristeza para a professora e pesquisadora Dra. Márcia Maria de Oliveira, da Universidade Federal de Roraima (UFRR), ao saber da morte do Papa Francisco. Em um depoimento comovente, ela relembrou sua convivência com o pontífice durante os preparativos e a realização do Sínodo da Amazônia, evento que resultou na exortação apostólica Querida Amazônia.
Márcia integrou o conselho de preparação do Sínodo e acompanhou de perto o envolvimento do Papa nas discussões. “Desde o primeiro encontro, me chamou muita atenção a escuta do Papa Francisco”, contou, destacando a capacidade do líder religioso de sintetizar e refletir sobre horas de debate em poucos minutos, com clareza e sensibilidade.
Em seu relato, a professora enfatizou o incentivo de Francisco à ousadia dentro da Igreja. “Ele dizia: ‘Eu não entendo por que vocês têm tanto medo de transbordar’”, recordou. Para Márcia, esse chamado era um apelo direto à superação das amarras do dogma e das estruturas patriarcais, especialmente no que diz respeito à participação das mulheres no ministério eclesial. “Não existe nenhum impedimento evangélico para a ordenação de mulheres. E, como Igreja, a gente não consegue transbordar.”
Outro ponto marcante foi uma conversa em que a professora presenteou o Papa com um livro sobre o genocídio indígena na América Latina. A reação de Francisco foi imediata: pediu mais estudos, mais denúncias e mais luz sobre o tema. “É preciso romper o silêncio”, afirmou ele, segundo Márcia. “Tem poucos estudos, e realmente tem poucos estudos sobre o genocídio dos povos indígenas. A gente estabeleceu um silêncio.”
A professora também destacou outro traço marcante do pontificado: a atenção constante aos migrantes e refugiados. “Uma das primeiras visitas que o Papa Francisco fez foi a Lampedusa, onde os migrantes estavam chegando mortos, assassinados, traficados. E ele manteve, durante todo o seu pontificado, uma atenção muito especial a eles”, afirmou.
Segundo Márcia, Francisco foi um dos papas que mais produziu documentos e cartas sobre o tema, desafiando a Igreja a ser missionária e presente junto aos migrantes. Ela também lembrou da obra de arte encomendada pelo Papa, hoje exposta na Praça São Pedro: um barco com migrantes de todas as gerações, como símbolo do compromisso pastoral com os excluídos. “Muito forte do ponto de vista da arte e da comunicação”, avaliou.
Para a professora, o legado de Francisco é um divisor de águas na história da Igreja. “Fica para mim essa coragem do Papa Francisco de jogar luzes até mesmo em temas que a Igreja não está muito animada a discutir. Sua simplicidade, sua escuta, sua humildade e sua coragem de transformar estruturas injustas são sinais de uma nova e necessária primavera eclesial.”
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