SÃO PAULO (SP) – Uma mulher trabalhadora doméstica, de 51 anos, mantida há 40 anos em condições análogas à escravidão, foi resgatada na terça-feira (13) em uma operação realizada na cidade de Santa Rosa do Viterbo, interior de São Paulo. A ação foi deflagrada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Segundo informações do MPT, a trabalhadora havia sido adotada por um casal de empregadores em um orfanato da cidade quando tinha 11 anos. Quando chegou à casa, foi obrigada a exercer atividades domésticas recebendo, em contrapartida, um “dinheirinho” para comprar balas. Os nomes dos empregadores e da trabalhadora não foram informados pelas autoridades.
Em depoimento às autoridades, a trabalhadora contou que até hoje continua cuidando dos afazeres domésticos da casa, além de cuidar do empregador idoso. Ela relatou que trabalha de segunda a sábado, das 7h às 21h, e aos domingos “passa um pano na casa” e lava a louça. Ela, inclusive, é obrigada a trabalhar em datas festivas e feriados como Natal, 1º de janeiro e carnaval. Nunca tirou férias e, nas vezes em que viajou, teve que cuidar do empregador idoso.
Por todas essas atividades ela recebe o que chamou de “agrado”, uma quantia de R$ 500 por mês, valor bem inferior ao salário mínimo do país, estabelecido atualmente em R$ 1.412.
Na casa, a trabalhadora sequer tinha um quarto próprio, tendo que dormir em um colchão inflável no chão, ao lado da cama do casal de empregadores. Em depoimento, a mulher contou que recolhe as contribuições previdenciárias desde 1993 por conta própria, como autônoma, e que recentemente o filho dos empregadores é quem faz os pagamentos.
Segundo a procuradora Regina Duarte da Silva, toda essa situação configura exploração de mão de obra. “Apesar do aparente vínculo parental, a trabalhadora claramente é explorada pela família como uma empregada há cerca de 40 anos, sem a formalização de contrato de trabalho. Ela não sai de casa, não tem direito a descanso, trabalha em jornada excessiva e vive de forma precária. Trata-se de um caso grave de violação de direitos humanos”, disse.
Durante a operação, os auditores-fiscais do Trabalho lavraram um auto de infração de resgate, dando à mulher o direito ao seguro-desemprego. Eles também vão fazer um levantamento das verbas salariais e rescisórias devidas à trabalhadora, além do valor de indenização por danos morais.
Trabalho análogo à escravidão
A legislação brasileira define o trabalho análogo à escravidão como toda atividade forçada desenvolvida sob condições degradantes ou em jornadas exaustivas e quando a pessoa é impedida de deixar o seu local de trabalho.
A lei penal caracteriza o trabalho escravo: trabalhos forçados, jornadas exaustivas, condições degradantes e restrição à locomoção por dívida com o empregador. O art. 149 do Código Penal determina prisão de 2 a 8 anos e multa pela violência causada à pessoa submetida a trabalho análogo à escravidão.
Muitos trabalhadores ainda se encontram em situação de escravidão no Brasil. No trabalho doméstico, na atividade agropecuária, na mineração, na construção civil ou na confecção têxtil, ainda existem pessoas que sofrem com atentados contra os seus direitos.
Denúncias podem ser encaminhadas ao Sistema Ipê, do Ministério do Trabalho e Emprego; o Aplicativo Pardal, do Ministério Público do Trabalho e o Disque 100, vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania.
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